O uso da popularidade e influência de artistas e celebridades para promover marcas, organizações e produtos é uma estratégia de marketing muito comum e eficaz. O fenómeno vem ganho espaço no jogo político, onde partidos políticos recorrem a artistas e celebridades para promover os seus candidatos e manifestos em tempos de campanha eleitoral.
Artistas e celebridades são contratados para actuarem em showmícios, usando a sua popularidade para arrastar massas e influenciar a intenção do voto do eleitorado. Nesses showmícios, artistas são oferecidas vestes de partidos políticos que os usam sem nenhuma reflexão sobre suas implicações na sua imagem e carreira que se quer de sucesso a médio e longo termo.
Apesar proporcionar benefícios financeiros imediatos para à figuras públicas envolvidas, a forma como se envolvem pode ter diversas implicações na sua imagem e carreira.
No cenário da “cultura de cancelamento” que se assiste, actualmente, em todo mundo, a forma como artistas e celebridades apresentam-se em público deve ser, criteriosamente, controlada. A “cultura de cancelamento” consiste na retirada do apoio à figuras públicas e empresas após terem feito ou dito algo considerado questionável ou ofensivo (Lightfoot, 2019 apud Norris, 2020, p. 2).
Recentemente, o artista moçambicano Mr. Bow foi vítima de “cancelamento” nas redes sociais por conta da sua indiferença à morte do Azagaia. O facto de não ter ido ao velório e inteiro do Azagaia, e não ter participado da marcha pacífica realizada em homenagem ao artista no dia 18 de Marco de 2023 parece ter sido a causa principal da desaprovação do Mr. Bow. O músico viu seu número de seguidores baixar e sua conta do Instagram bloqueada, sem explicação exacta do que estava a acontecer e/ou teria feito. Questionado sobre o assunto, Mr. Bow conformou o sucedido. Apesar de não conhecer o fenómeno e sobretudo as suas motivações, lamentou e condenou a atitude, considerando-a uma tentava de assassinar a cultura e particularmente os artistas nacionais[1].
A não participação do Mr. Bow na marcha e no velório do Azagaia pode ter criado, no seio do público, uma percepção de afastamento do artista ao povo que legitimou o seu sucesso artístico, aderindo às suas músicas e espetáculos, num momento em que mais o precisava. Como forma de boicotar e se calhar retalhar, o povo usou das redes sociais para manifestar o seu descontentamento, retirando seu apoio ao artista, tendo culminado com o bloqueio das suas contas de redes sociais.
A decisão de uso ou não de vestes de partidos políticos em showmícios por artistas e celebridades deve ser antecedida de uma avaliação profunda sobre as implicações que pode ter na sua imagem e carreira. Não trata-se de por em causa o direito à associação ou de participação em partidos políticos[2]. Mas sim, chamar atenção aqueles que, não militando num determinado partido, são contratados para emprestar sua popularidade a candidatos de partidos políticos.
Um artista ou celebridade que não milita num determinado partido não tem obrigação de por vestes com cores ou estampas de candidatos eleitorais. Colocar vestes de partidos políticos pode ser arriscado para artistas e celebridades. O público valoriza a autenticidade. Se um artista abraça uma causa política, isso deve parecer genuíno e alinhado com seus valores e história pessoal. Usar vestimentas de partidos políticos por motivos de capitalizar a possibilidade de contratação pode ser percebido como oportunismo.
A imagem de um artista é parte de sua marca pessoal. O uso de vestes de partidos políticos associa o artista ou celebridade ao partido político e isso pode redefinir sua imagem e afectar a forma como será percebido, tanto pelos fãs quanto pela indústria. A aderência a um partido pode dividir os fãs do artista, já que nem todos concordarão com suas escolhas políticas. Isso pode ter impactos financeiros e na base de fãs ao longo prazo.
[1] https://www.facebook.com/watch/?v=216439124402991
[2] Artigo 53 da Constituição da República de Moçambique aprovada em 2018.
Bibliografia
Norris, P. (2020). Closed Minds? Is a ‘Cancel Culture’ Stifling Academic Freedom and Intellectual Debate in Political Science? Harvard Khenned School.
Melo, T. M. P. & Vasques, E. G. (2021). Cultura de cancelamento: primeiras aproximações, Etcétra, Revista del Área de Ciencias Sociales del CIFFyH, No 8.
Constituição da República de Moçambique aprovada em 2018